Por Henrique Machado
Porque o caos não vem sozinho, o Governo do Distrito Federal decidiu presentear o Guará com dois luxuosos monumentos à má gestão da saúde pública: a construção de uma nova UPA e de um Hospital Clínico Ortopédico já começou. Palmas, por favor. Afinal, nada como levantar paredes novas enquanto dentro das antigas o povo agoniza sem médico, sem remédio, sem insumo e, agora, sem esperança.
Sim, é isso mesmo. A saúde pública no Guará mal consegue manter o básico funcionando — e o governo acha sensato inaugurar mais uma UPA, como se fosse uma partida de SimCity. Enquanto o Hospital Regional do Guará vive o escárnio da retirada do adicional de insalubridade dos servidores (o que, aliás, o próprio sindicato já classificou como ilegal), e profissionais vivem sob ameaça de novos cortes, a solução encontrada foi... construir mais um palco para o sofrimento.
E não pense que é só uma ideia jogada ao vento. As obras já estão a pleno vapor. Porque no DF, quando falta gestão, sobra cimento. Os hospitais vivem superlotados, a atenção primária é subfinanciada e mal executada (com um índice vergonhoso de apenas 67% de execução orçamentária), mas isso não impede que o governo siga com o seu fetiche por inaugurações. Construir resolve tudo, desde que você não se importe se o prédio estiver vazio, sem médicos, sem estrutura, sem lógica.
Quer entender a profundidade do absurdo? As UPAs foram pensadas para manter o paciente por até 24 horas. Mas como nada funciona como deveria, viraram depósitos permanentes de doentes. No Guará, as unidades já estão tão colapsadas que a única coisa que se renova é a indignação. O que mais falta? Ah, claro: trânsito infernal, ambulâncias presas em engarrafamentos, falta de estacionamento, barulho constante de sirenes, aumento da criminalidade, desvalorização da região… É isso que os moradores terão que agradecer.
Mas fiquem tranquilos: quando a ambulância travar no meio da rua sem vaga para parar, pelo menos ela estará indo para um prédio novinho em folha. E se o paciente não for atendido, pelo menos morrerá diante de uma fachada reluzente.
Enquanto isso, servidores do Hospital Regional do Guará assistem ao corte de seus direitos e à deterioração das condições de trabalho. A saúde virou uma roleta russa institucional: ou você adoece na fila ou enlouquece trabalhando dentro do sistema. E se reclamar, ainda pode ter o contracheque mutilado.
A pergunta que ninguém responde é simples: pra que construir mais, se nem conseguimos fazer funcionar o que já temos? Será que a estratégia é esconder o fracasso empilhando tijolos?
O Guará não precisa de mais concreto. Precisa de gestão. Precisa de compromisso. Precisa de respeito. E, acima de tudo, precisa de um governo que saiba que saúde pública não se faz com maquete, mas com gente qualificada, com orçamento bem aplicado e com coragem para enfrentar o problema de frente — e não maquiá-lo com mais uma obra para a próxima faixa de inauguração.
Porque no ritmo que vamos, o slogan da saúde pública no DF só pode ser um:
“Se não pode curar, ao menos que tenha fachada bonita pra foto""
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