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Bate Papo com prefeito Comunitário da QE/QI 09 e presidente da Junpag José Maria de Castro

Em tempos de crescente distanciamento entre a população e o poder público, iniciativas de base como as prefeituras comunitárias seguem firmes no propósito de representar os interesses locais e promover a organização social. Para entender melhor esse papel, a Folha do Guará entrevistou José Maria de Castro, atual prefeito comunitário da QE/QI 09 e presidente da Junpag (Junta de Prefeituras e Associações do Guará), uma das lideranças mais atuantes da cidade.

Ao longo da conversa, José Maria compartilha reflexões sobre segurança, participação popular, meio ambiente, políticas públicas, cultura e os desafios enfrentados pelas lideranças comunitárias diante da burocracia e da falta de apoio institucional. Ele também analisa o cenário atual do Guará, destaca boas práticas implementadas na QE/QI 09 e reforça a importância da união entre moradores e comerciantes como motor de transformação social.

Com linguagem direta e experiência acumulada, José Maria defende uma atuação apartidária, comprometida com as demandas reais da comunidade. A entrevista oferece um panorama atual e honesto sobre o papel das prefeituras comunitárias e convida os leitores a refletirem sobre o potencial de mobilização coletiva na construção de uma cidade mais justa, participativa e integrada.


Folha do Guará: Como você define o papel de uma prefeitura comunitária nos dias atuais, especialmente em um cenário de distanciamento entre governo e população?

José Maria: O papel de uma Prefeitura ou Associação Comunitária é ser o elo entre os moradores e comerciantes da quadra, tendo como função principal acolher as demandas, analisar as necessidades e dar prosseguimento junto às autoridades. Quanto ao distanciamento, não vejo problemas com a Administração do Guará, onde o nosso administrador, Sr. Arthur Nogueira, vem fazendo um excelente trabalho. Quanto à Neoenergia/CEB, de fato, os serviços deixam a desejar. A segurança no Guará é aceitável, e só não é melhor devido à nossa legislação, que infelizmente não favorece o cidadão de bem.

Folha do Guará: A QE/QI 09 é uma das referências em organização comunitária no Guará. Quais fatores ajudaram a construir essa realidade?

José Maria: O respeito e a interação entre moradores e comerciantes.

Folha do Guará: Quais foram os maiores desafios enfrentados historicamente pela QE/QI 09, e como a atuação da prefeitura comunitária contribuiu para superá-los?

José Maria: Quando assumimos os trabalhos, havia um foco intenso de tráfico de drogas. Por meio de diálogos e parcerias com os órgãos responsáveis, conseguimos combater esse problema. Hoje posso afirmar que vivemos em um ambiente de paz e tranquilidade.

Folha do Guará: Que valores norteiam sua atuação enquanto prefeito comunitário e presidente da Junpag?

José Maria: O respeito ao próximo e a responsabilidade diante dos problemas, sempre buscando envolver e unir a comunidade para alcançarmos nossos objetivos.

Folha do Guará: O que levou ao esvaziamento das prefeituras comunitárias no Guará, e como a Junpag está trabalhando para reverter isso?

José Maria: O Guará nunca teve tantas prefeituras, associações e lideranças comunitárias como tem atualmente. Quando iniciamos a Junpag, havia apenas seis representantes.

Folha do Guará: Quantas prefeituras comunitárias estão atualmente legalizadas no Guará?

José Maria: Entre prefeituras, associações e lideranças comunitárias, giramos em torno de 30 (trinta), todas cadastradas na Junpag. As prefeituras e associações, devido às despesas obrigatórias, acabam desestimulando interessados em realizar um trabalho mais profundo, o que leva muitos a atuarem posteriormente apenas como líderes comunitários.

Folha do Guará: Como a Junpag tem apoiado a formalização e o fortalecimento dessas prefeituras?

José Maria: A Junpag disponibiliza aos interessados o seu Estatuto Social e oferece orientações sobre o processo eleitoral, sem, no entanto, interferir na administração ou funcionamento das entidades.

Em 2022, a candidata a deputada distrital Renata D’Aguiar, por intermédio do Dr. Celso, morador do Guará, realizou uma doação no valor de R$ 5.000,00 (cinco mil reais). Esses recursos foram utilizados para cobrir diversas despesas, como emolumentos cartoriais, apoio com combustíveis para diretores da Junpag e a regularização da documentação da entidade. O valor foi inicialmente repassado a mim como apoio à campanha da candidata, mas, com anuência do Dr. Celso e ciência da diretoria, decidi aplicá-lo integralmente na Junpag, considerando o contexto e os desafios enfrentados à época.

Folha do Guará: Em sua avaliação, a Administração Regional do Guará tem respondido adequadamente às demandas das prefeituras comunitárias?

José Maria: O administrador Arthur Nogueira tem sido um elo entre as entidades, os representantes e os moradores que o procuram. É uma grata surpresa sua atuação à frente da Administração, com uma equipe que tem trabalhado com muita responsabilidade.

Folha do Guará: Como você vê a relação entre participação popular e as políticas públicas no Guará e no DF?

José Maria: Infelizmente, é uma relação muito centralizada, o que impede que os objetivos de quem vive a realidade local sejam alcançados. As ações políticas precisam existir, mas não devem atrapalhar o desejo da maioria.

Folha do Guará: O esvaziamento das administrações regionais afetou o vínculo entre moradores e governo. Como isso tem sido enfrentado pela QE/QI 09?

José Maria: A centralização dos serviços afetou todo o DF. O DF Legal, por exemplo, é um órgão que só recebe críticas, especialmente de moradores das QE's 01, 03, 05 e 09, quanto à proteção de áreas ambientais e à retirada de cercamentos de segurança construídos há mais de 20 anos. A morosidade da Novacap também é outro exemplo.

Folha do Guará: Qual tem sido o nível de diálogo e parceria da JUNPAG com os órgãos públicos e a Administração Regional?

José Maria: A Junpag – Junta de Prefeituras e Associações – é bastante respeitada por sua atuação apartidária. Mantemos bom diálogo com os órgãos de segurança, Corpo de Bombeiros, Administração Regional, Conselho Tutelar e Regional de Ensino.

Folha do Guará: A Lei nº 6.915/2021 permite que prefeituras comunitárias e outras organizações cuidem da manutenção de espaços públicos. Como você avalia essa lei?

José Maria: Acreditamos que essa proposta não tem eficácia prática. Sozinhos, ninguém chega a lugar algum.

Folha do Guará: Essa transferência de responsabilidades para as comunidades pode gerar empoderamento ou sobrecarregar as prefeituras comunitárias?

José Maria: Temos certeza de que isso tende ao insucesso.

Folha do Guará: Quais experiências e práticas da QE/QI 09 podem servir de exemplo para outras quadras do Guará e do DF?

José Maria: Primeiramente, é fundamental que moradores e comerciantes gostem do local onde vivem. Temos uma programação de festas ao longo do ano que promove valorização e integração, o que se reflete no cuidado com a conservação e a limpeza da quadra.

Folha do Guará: Como a preservação da identidade cultural e comunitária do Guará pode contribuir para o fortalecimento das prefeituras?

José Maria: A cultura é, sem dúvida, essencial para o desenvolvimento da comunidade como um todo. Nossa quadra já sediou a Ala das Crianças, junto à GRES Império do Guará, durante a presidência do Sr. Mário Santos.

Folha do Guará: Quais contribuições as prefeituras comunitárias podem dar para questões como meio ambiente, segurança e mobilidade?

José Maria: As prefeituras e os líderes comunitários já atuam nessas frentes. Hoje há uma consciência crescente sobre o meio ambiente, e na área da segurança temos ocupado os espaços públicos com crianças, jovens e pessoas da melhor idade.

Folha do Guará: Como evitar que as prefeituras comunitárias se tornem espaços de politicagem e percam sua função social?

José Maria: Um dos critérios para abrir uma prefeitura ou associação é que, durante o mandato, o foco esteja nas necessidades da comunidade. Após o encerramento do mandato, os dirigentes podem seguir os caminhos que desejarem.

Folha do Guará: De que forma a juventude tem participado das ações comunitárias? Como estimular maior envolvimento dos jovens?

José Maria: Com diálogo. Os jovens gostam de participar na construção de um ambiente melhor. Inclusive, os adolescentes e jovens apelidaram nossa quadra de “9York”.

Folha do Guará: Quais os maiores obstáculos estruturais, financeiros e legais que as prefeituras comunitárias enfrentam hoje?

José Maria: Estruturalmente, estamos vencendo com muita união e respeito. Financeiramente, os moradores se cotizam para realizarmos os eventos e melhorias necessárias.

Folha do Guará: Que impacto as atividades culturais e eventos na QE/QI 09 têm na integração e no sentimento de pertencimento da comunidade?

José Maria: Os moradores da QE/QI 09 são privilegiados. Não há outra quadra no Guará com tantos eventos quanto a nossa — talvez nem mesmo igual. No Projeto Cultural do Guará, uma grata iniciativa da deputada Dayse Amarillo, os organizadores nos disseram que, em nenhum outro local, foram tão bem recebidos e tiveram tanta presença de público, o que tornou o evento ainda maior.

Folha do Guará: Em um contexto de polarização política, como manter o foco nas causas comunitárias sem disputas partidárias?

José Maria: É preciso deixar de lado a ideologia política e representar a comunidade. Todos os partidos políticos são importantes para o bom funcionamento do trabalho comunitário.

Folha do Guará: Qual é a sua visão para o futuro do Guará enquanto cidade participativa, sustentável e justa? O que falta para chegar lá?

José Maria: Hoje é difícil dizer. A nossa cidade está crescendo bastante, tanto vertical quanto horizontalmente. Ainda não tenho uma opinião formada se esse crescimento ocorre de maneira responsável.

Folha do Guará: Para finalizar, qual legado você deseja deixar como líder comunitário, e o que espera que as próximas gerações deem continuidade?

José Maria: Essa resposta deixo para os moradores e comerciantes. Eles conhecem os problemas que existiam no passado e sabem como é a realidade hoje. Com essa transformação positiva na quadra, costumo brincar dizendo que “todos os moradores e comerciantes são os culpados pela paz que hoje habita em nosso meio”.

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